quinta-feira, 13 de maio de 2010

Acordo da Santa Sé e o Estado brasileiro

Comentário: Pe. Luciano Sotero Teles


1. Histórico dos acordos da Santa Sé com o Brasil


Somente 1826 que a Santa Sé começa a ter relações diplomáticas com o Brasil. A partir dessa data foi firmado com o Estado Brasileiro três acordos. O primeiro foi em 1935 sendo um acordo administrativo de troca de Correspondência diplomática, o segundo foi em 1989 sobre o estabelecimento do Ordinariado Militar e Nomeação de Capelães Militares e o terceiro foi promulgado pelo presidente Lula em 11 de Fevereiro de 2010 com o objetivo de “consolidar, em um único instrumento jurídico, diversos aspectos da relação do Brasil com a Santa Sé e da presença da Igreja Católica no Brasil, já contemplados na convenção de Viena sobre relações diplomáticas, na Constituição Federal, e em demais leis que configuram o ordenamento jurídico brasileiro.” Samuel Pinheiro Guimarães Neto, Secretário Geral do Itamaraty

O atual acordo foi assinado pelo Brasil e a Santa Sé no dia 13 de Novembro de 2008. Depois de discutido na Câmara dos deputados federais, essa o ratificou em 27 de Agosto de 2009 e passou para apreciação do senado que aprovou em 7 de outubro de 2009



2. Síntese do acordo promulgado pelo Brasil em 2010


Art. 1 - Dispõe sobre a representação diplomática do Brasil e da Santa Sé, nos termos da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas;

Art. 2 - O Brasil reconhece à Igreja Católica o direito de desempenhar sua missão apostólica;

Art. 3 - O Brasil reconhece a personalidade jurídica das Instituições Eclesiásticas mediante inscrição no registro pertinente do ato de criação, nos termos da legislação brasileira;

Art. 4 - A Santa Sé garante que a sede dos Bispados estará sempre em território brasileiro;

Art. 5 - Dispõe que os direitos, imunidades, isenções e benefícios das pessoas jurídicas eclesiásticas que prestam também assistência social serão iguais aos das entidades com fins semelhantes, conforme previstos no ordenamento jurídico brasileiro;

Arts.. 6 e 7 - Dispõem sobre o patrimônio histórico e cultural da Igreja Católica no Brasil, assegurando a proteção dos lugares de culto e a cooperação entre Igreja e Estado com vistas a salvaguardar e valorizar esse patrimônio (incluindo documentos em arquivos e bibliotecas), bem como facilitar o acesso a todos que queiram conhecê-lo e estudá-lo;

Art. 8 - O Brasil assegura a prestação de assistência espiritual pela Igreja a fiéis internados em estabelecimentos de saúde ou prisional que a solicitarem, observadas as normas das respectivas instituições;

Arts. 9, 10 e 11 - Dispõem sobre temas relacionados à educação: garante à Igreja o direito de constituir e administrar Seminários e outros Institutos eclesiásticos; estipula que o reconhecimento recíproco de títulos e qualificações em nível de Graduação e Pós-Graduação estará sujeito às respectivas legislações e normas; e dispõe sobre o ensino religioso de matrícula facultativa nas escolas públicas de ensino fundamental, sem discriminar as diferentes confissões religiosas praticadas no Brasil;

Art. 12 - Estabelece que a homologação de sentenças eclesiásticas em matéria matrimonial será efetuada nos termos da legislação brasileira sobre a matéria;

Art. 13 - É garantido aos Bispos da Igreja Católica manter o segredo do ofício sacerdotal;

Art. 14 - O Brasil declara seu empenho em destinar espaços para fins religiosos no planejamento urbano no contexto do plano diretor das idades;

Art. 15 - Dispõe sobre o reconhecimento pelo Brasil da imunidade tributária referente aos impostos das pessoas jurídicas eclesiásticas e garante às pessoas jurídicas da Igreja que exercem atividades sociais e educacionais sem fins lucrativos os mesmos benefícios;

Art. 16 - Trata do caráter religioso das relações entre os ministros ordenados e fiéis consagrados e as Dioceses ou Institutos Religiosos as quais, observado o disposto na legislação trabalhista brasileira, não geram vínculo empregatício, a não ser que comprovado o desvirtuamento da função religiosa da Instituição;

Art. 17 - Trata da concessão de visto permanente ou temporário para sacerdotes, membros de institutos religiosos e leigos, que venham exercer atividade pastoral no Brasil, nos termos da legislação brasileira sobre a matéria.


3. Perspectivas do acordo

Foram grandes as discussões para aprovação desse acordo entre o Brasil e a Santa Sé. Os pontos mais polêmicos foram: ensino religioso nas escolas públicas, a proibição de demolição de edifícios ou objetos ao culto católico, isenções ficais e a imunidade das instituições religiosas perante as leis trabalhistas.

É claro que esse acordo é muito bom para a Igreja Católica. Não porque trás privilégios em relação às outras igrejas ou religiões, mas porque dá solidez aos direitos da igreja já previstos na própria constituição federal, consolidando num único instrumento jurídico. Não é um privilégio porque assim como a Igreja Católica fez esse acordo com o estado brasileiro todas as outras igrejas podem fazer também, mesmo não sendo um acordo internacional.

Quanto ao Ensino Religioso, o acordo só vem enfatizar a importância deste para a formação básica do cidadão e assegurar que continue acontecendo nas escolas públicas, já que se cogitava a possibilidade de acabar.

É claro que quem vai ensinar o ensino religioso nas escolas deve ter uma experiência religiosa de qualquer natureza. Mesmo ensinando sobre o fenômeno religioso de modo geral vai partir da experiência pessoal que tem dentro da sua religião. E ao fazer esse acordo a Igreja católica dar a entender que está muito interessada em aproveitar esse espaço educacional para difundir sua doutrina.

No acordo está previsto também que o estado passa a assumir, conjuntamente com a Igreja, a responsabilidade de manter o patrimônio cultural da Igreja no Brasil. Isso faz com que passem a pertencer formalmente também ao estado brasileiro, mesmo permanecendo sob Custódia e salvaguarda da Igreja.

As isenções ficais e a imunidade das instituições religiosas perante as leis trabalhistas também gerou polêmica quando veio a público a redação do acordo, mas não trás novidades porque quem trabalha como voluntário, independente de ser em alguma empresa ou instituição religiosa, estando de acordo com a legislação trabalhista brasileira, não gera vínculo empregatício.

Fala-se muito na mídia que com esse acordo a Igreja faz “pressão sobre as consciências” querendo se impor como a “religião oficial do Brasil”, que esse acordo é uma volta a “inquisição”, que a Igreja está querendo impor sua doutrina... Mas não se vê concretamente nada que possa fundamentar essas acusações.

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